"Pajubá é o nome da linguagem popular constituída da inserção em língua portuguesa de numerosas palavras e expressões provenientes de línguas africanas ocidentais, muito usado pelo chamado povo do santo, praticantes de religiões afro-brasileiras como candomblé e umbanda, e também por mulheres transexuais e pela comunidade LGBT como um todo.
A linguagem é baseada em várias línguas africanas umbundo, kimbundo, kikongo, nagô, egbá, ewe, fon e iorubá, usadas inicialmente em terreiros de candomblé. Criado originalmente de forma espontânea em regiões de mais forte presença africana no Brasil, como terreiros de umbanda e candomblé, o dialeto resultante da assimilação de africanismos de uso corrente, por resultar incompreensível para quem não aprendesse previamente seus significados, passou a ser usada também como código entre travestis e posteriormente adotado por todas as comunidades LGBT+"
E foi esse o nome escolhido por Linn da Quebrada para ser título de seu novo álbum de financiamento coletivo, que por si só, complementa a ordem de militância lgbt+ de seu conteúdo.
Com letras que recorrem a expressões diretas sobre sexualidade e gênero, Linn da Quebrada surge com um Álbum que lembra a importância carregada de simbologias e discursos de liberdade que a era da Valesca do funk trouxe pro feminismo de liberdade sexual feminina. Linn assume esse papel mas, de maneira terrorista como a própria declara, demonstrando um alento de liberdade e controle sobre o próprio corpo de preta, travesti, periférica, afeminada e bicha.
Todas as canções que compõem o álbum trazem em seu cerne repetições como afirmações, de termos como cu, piroca, pica, rabo, macho, bixa, afeminada. Como uma maneira de ditar que os corpos marginalizados das travestia e bixas afeminadas lhes possui. São delas, para serem vivenciadas como bem quiserem. É quase como um ritual de percepção e de desbravamento por ocupação de seus espaços de direito negados pela sociedade e pela heteronormatividade cis branca e patriarcal. O corpo da travesti por si só é uma subversão dos padrões estabelecidos pela sociedade que molda e determina como devem ser feitos, vistos e usados. Por ser preta, Linn ainda se utiliza de sua negritude para trazer mais peso nas batidas e acordes das músicas remetendo a cânticos e rituais tribais. A sonoridade que mescla funk com distorções e sintetismos quase que de maneira psicodélica quando se escuta com fones de ouvido - tanto nos instrumentos como na voz, que possui camadas que flertam justamente com o feminino e o masculino, o erótico e o bruto - ganham ares de palavra de ordem contra conservadorismos e a marginalização.
Linn canta que não é feita pra se esconder. Não é feita para ser usada quando não queira, que não é ela ou ele. Que Linn é Linn. Assim como as travestis são travestis. Ela canta sobre opressões e discriminações através de estereótipos de gênero e conduta. Canta sobre sexualidade vasta sem regras e de independência pelo próprio prazer. Canta sobre a carne negra que resiste e grita, pra de dor e ora de terror. Canta sobre como as vielas dos becos das favelas e pontes são semelhantes as vias das veias, do sangue e das rachaduras que o povo lgbt+ carrega por existir. Pajubá, ironicamente utiliza desse "dicionário" da cultura lgbt+ para fazer-se entender de forma reta. Sem entrelinhas.
De forma suja, nojenta, baixa, vulgar, sombria e verdadeira. Um trabalho que ganha contornos de obra artística quando percebido através dos áudio videos em seu canal do YouTube para todas as 14 faixas. Com participações de Mulher Pepita, Liniker, Gloria Groove dentre outres, Linn da Quebrada parece ter deixado claramente escuro, que chegou a hora do mercado fonográfico abrir espaço não só pra cis gays ou cis lésbicas e bis, ou para drags. Mas, chegou a hora de transvestir-se para ser ocupado pelas travestys.
Nem que esse espaço tenha que ser aberto a força, como um Ocâni odara didê num edí.
Necessário e (re) existência.
Minhas preferidas: "Submissa do 7° dia", "Bixa Travesty", "Transudo", "Necomancia", "Enviadescer", "Pirigoza" e "Serei A".