'Transexualidade, Transexualismo, Síndrome de Harry Benjamin,
Transtorno de Identidade de Gênero, Disforia de Gênero ou ainda Disforia
Neurodiscordante de Gênero são expressões referentes à mesma coisa: a condição
na qual a pessoa se identifica psicologicamente como sendo do gênero oposto ao
seu sexo genético e sente impropriedade em relação ao próprio corpo.
Esta condição por via de regra gera um desconforto emocional
e psicológico ao transexual, por isso existe a iniciativa de “transitar” (por
meio de tratamento hormonal e cirurgias de redesignação sexual) de um gênero
anatômico a outro. O termo clínico mais recomendado hoje em dia é Disforia de
Gênero, bem como Transexualidade.
A última classificação americana dos transtornos mentais
(DSM-IV-TR) retirou dos seus diagnósticos os termos transexualismo, travestismo
e homossexualismo. Ao invés disso, adotou-se o termo Transtornos da Identidade
de Gênero, que é visto como menos preconceituoso ou discriminatório.
A identidade de gênero refere-se à masculinidade e à
feminilidade, ou melhor, à convicção que cada um tem sobre si de ser masculino
ou feminino. Isso se forma muito precocemente, desde o estágio intra-uterino, e
decorre: da soma de causas genéticas e hormonais (vão determinar os caracteres
físicos do bebê, se vai nascer com características de menino ou menina); da
atitude dos pais ao aceitar ou não o sexo do bebê, a forma como esse bebê vai
ser manuseado e tratado (a menininha ou o garotão); da interpretação do bebê a
respeito dessas atitudes paternas; da formação do ego corporal (o bebê vai
formando uma idéia a respeito de si a partir de sensações que surgem com a
manipulação de seu corpo)'.
Bree (Felicity Huffman) é uma transexual que, antes de mudar de sexo, fez um filho. O garoto, Toby (Kevin Zegers), é agora um adolescente que sonha encontrar o pai que nunca conheceu. Os dois se reencontram - sem que ele saiba sobre a identidade verdadeira de Bree - e partem, juntos, numa viagem de carro a Los Angeles.
É sob a seguinte premissa que o Road Movie ‘Transamérica’,
filme do diretor e roteirista Duncan Tucker, nos é apresentado de forma leve e
condescendente.
Com uma gostosa trilha sonora que encontra seus melhores
momentos nas cenas de drama intenso e discussões, orquestrada pelo competente David
Mansfield, que inclusive nos presenteia com a original e bela ‘Travelin' Thru’ (de
Dolly Parton), que lhe rendeu uma indicação ao Oscar por melhor canção original
em 2006, Transamérica é um filme carregado por um roteiro bom, mas é elevado
pela atuação impar de Felicity Huffman.
O filme nos mergulha nos dramas e incertezas e no sofrimento
incubado de uma transsexual que luta há anos para se tornar o que já é em
pensamento – uma mulher.
Sem condições financeiras, ela se prende aos hormônios tomados
religiosamente todas as manhãs e a noite; visita regularmente clinicas de
psiquiatria e psicologia a fim de obter a permissão e o aval de seu seguro de saúde
para fazer a tão almejada cirurgia de mudança de sexo.
O roteiro de Tucker revela superficialmente a extrema carga
emocional e psicológica de homens e mulheres que apresentam tal transtorno de gênero.
É pertinente o modo como ele deixa claro que não se trata de doença ou confusão
e sim, uma condição genética onde o individuo possui desde o nascimento uma
identidade que não corresponde a seu gênero sexual. Para Bree, ela não é um
homem, é uma mulher, independente do que for, ela age, pensa como uma mulher.
Não é uma travesti, há diferença. Não são somente as roupas que a caracterizam
assim.
Tudo isso nos é apresentado através de diálogos e situações corriqueiras
de seu dia a dia, como o olhar no espelho assim que acorda, o ato de se maquiar,
a ida ao banheiro, as conversas com a psicóloga e etc.
A chegada do filho inexistente ate então é o artifício que o
roteiro encontrou para causar o impedimento a seu sonho da operação. Apesar de
ser interessante ao primeiro momento, por colocar em xeque a transformação, a
decisão e a postura de gênero que ela assumiria - paternidade ou maternidade? –
com esse fato, a narrativa peca em alguns pontos.
Ao criar um filho totalmente desconexo com sua realidade,
Tucker demonstra querer mostrar um panorama que vai alem da transexualidade.
Ele (Toby) é um jovem de 17 anos, aparentemente frio ao
bater de frente com suas emoções, que perdeu a mãe, que tem problemas com o
padrasto, que se prostituiu para comprar drogas – cocaína -, bissexual resolvido
e um tanto o quanto bipolar; que almeja ser um ator pornô.
Com uma carga dramática dessas, o ator Kevin Zegers e o próprio
roteiro não conseguem, contudo conferir verossimilhança a narrativa, o enredo
se perde também, por exemplo, quando Bree afirma que o caso que teve com a mãe
de Toby só aconteceu durante a faculdade porque ele acreditava que ela fosse lésbica.
Ele afirma que ela era lésbica e não bissexual. A informação nos leva crer que
tudo não passou de uma noite de puro sexo entre dois amigos, experimentação própria
da idade. Mas então surge Toby, com uma mãe suicida e que era casado com um
homem. Onde sua sexualidade não é exposta nenhuma vez, nem mesmo os motivos de
seu suicídio.
Mas mesmo essas falhas de andamento de narrativa são perdoadas
quando vemos cenas de extremo bom gosto, carregados de clichês que são
permitidos aqui, que nos conduzem naturalmente a sua conclusão, passando sua
mensagem, nos sensibilizando e mais do que isso, nos informando sobre esse mundo.
Não é um filme sobre o transsexualismo e nem mesmo sobre
opções sexuais, é um filme que versa sobre liberdade de ser quem é – ‘o importante
é ser você, mesmo que seja estranho, bizarro, seja você’ -. Ele desmistifica preceitos
ate mesmo religiosos acerca do tema, humaniza, simplifica e emociona.
Mas mais uma vez, é impossível falar de Transamérica sem exaltar
a atuação fantástica de Felicity Huffman. Ela carrega o filme todo no salto alto
e no batom. Consegue nos demonstrar na impostação de voz comedida, nos
trejeitos na forma de andar, no olhar tudo que sua personagem exige. Sempre na
dosagem certa.
Alias o filme inteiro, o espectador fica em duvida se esta
diante de uma mulher ou de um homem. E isso demonstra um trabalho de caracterização
fantástico! Se tal papel já seria difícil para um homem executar, para uma
mulher, ter que atuar como se fosse um homem que se sente uma mulher é ainda
mais difícil e admirável por ter conseguido com tamanha maestria. Tal trabalho
lhe rendeu inclusive o Premio de Júri no Festival de Berlin, um Globo de Ouro
como Melhor Atriz de Drama e uma indicação ao Oscar 2006 de Melhor Atriz do Ano
que ficou com Reese Witherspoon (Johnny e June).
Sua melhor cena, esta quando ela esta no hospital com sua psicóloga.
É de aplaudir de pé.
O maior trunfo do filme como um todo fica ao deixar claro,
que o transsexualismo não é um fato de orientação sexual e sim de identidade de
gênero. Que as escolhas são fundamentais e devem partir de nós mesmos. Que a
liberdade em toda a sua concepção é essencial para se viver e que como um bom Road
Movie, é na estrada da vida que encontramos os personagens chave para nos
encontramos durante a viagem.
Um filme independente que poderia ter finalizado sendo sensacional
– como sua cena final que denota a aceitação plena da condição daqueles dois
personagens com eles mesmos, através de atos e de uma fala – mas que preferiu
por escolha ou falha mesmo, se encerrar sendo apenas um bom filme.
Não é um filme de gênero, é um filme feito para todos.
FICHA TÉCNICA
Diretor: Duncan Tucker
Elenco:
Felicity Huffman, Kevin Zegers, Fionnula Flanagan, Graham Greene, Burt Young,
Elizabeth Peña
Produção: Rene Bastian, Sebastian Dungan, Linda Moran
Roteiro: Duncan Tucker
Fotografia: Stephen Kazmierski
Trilha Sonora: David Mansfield
Ano: 2005
País: EUA
Gênero: Comédia Dramática
Classificação: 14 anos
Artigo interessante que explica as diferentes a cerca de Homossexualismo, Transsexualidade e Travestismo >> abcsaude
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