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quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Critica: Holy Motors


O filme que foi aplaudido de pé durante longos 15 minutos no Festival de Cannes de 2012. E merecidamente.

AÇÃO!

Holy Motors, novo filme – depois de um hiato de mais de quatro anos – do diretor Leos Carax é um deleite incomodo a cinéfilos do mundo todo.


O filme inicia-se com trechos de um filme em preto e branco, mudo, antigo, de um homem forte, de costas e nu, fazendo movimentos corporais. Em seguida somos levados a uma sala de cinema. Onde os espectadores nos olham. A montagem eficaz nos leva então para um quarto onde um senhor (o diretor Carax) acorda em seu quarto de papeis de parede repletos de arvores, como a simular uma floresta em preto e branco, após escutar sons de porto. De barcos chegando ou desembarcando do cais.
Ele investiga a origem do som e através de uma chave de metal que é um de seus dedos da mão direita, ele abre um portal através da parede de floresta branca e recai sobre a sala de cinema do inicio. Onde todos os expectadores dormem, enquanto vemos que a origem dos sons vem do filme passando na tela grande.
No corredor da sala vemos uma criança fugindo de 2 enormes cães, para em seguida vislumbrarmos uma menina dando tchau a seu pai através da janela de seu quarto numa casa que parece um grande iate.
O Homem, que já não é mais Carax e sim Lavant, entra numa limousine branca dirigida por uma senhora de cabelos brancos belíssima. E assim inicia-se Holy Motors.

Essa sequência já nos coloca a par do surrealismo proposto em tela. Mas mais do que isso, essa sequência metafórica nos mostra a intenção clara do diretor ao realizar tal obra: falar e transpassar o Cinema.
Holy Motors nada mais é do que um Ode a sétima arte, a arte e a indústria. Uma critica pessoal que remonta todas as características históricas dos filmes desde seus primórdios e o publico que o acompanha ao longo dos anos. Quando Carax acorda e abre o portal para o cinema, nada mais esta fazendo do que nos apresentando seu mundo. Seu mundo cinematográfico, nos convidando a embarcar(daí o cais e o porto) nessa experiência que nem sempre será clara, nem sempre será bela (os caos perseguindo e provavelmente atacando a criança), mas que será cinema em toda sua brutalidade, verdade e mentira bela.
A critica esta no publico que dorme diante da arte, esta nas lapides que só servem como banner para vender produtos, na beleza contrastando com a feiura, ser cinema pela fama e não pela identificação e essência, esta na própria limusine e no dialogo de Oscar com seu suposto chefe:

“Porque você ainda faz isso Oscar?”// “Pelo mesmo motivo que comecei. Pela beleza do ato”// “mas e quando não houver mais ninguém para ver?” 

e a cena se dissolve como se nunca houvesse existido. Deixada sem resposta. O dialogo fala do cinema. Do porque vemos e fazemos cinema. 'Pela beleza do ato'. Mas será que ainda há alguém vendo?

Cada vez mais o publico aplaude de pé e exalta super produções artificiais e sintéticas, com efeitos especiais milionários, ou romances vazios sem conteúdo algum; e dormem literalmente diante de obras que caem fundo na comunicação social e na arte sensorial clássica.
O Artista já não é mais visto como vagabundo ou genial. É visto como galã e diva. Cinema da beleza para estampar editoriais de moda.

É a visão de Carax sobre uma indústria e uma arte que vai perdendo espaço para as câmeras de mão, dos celulares. “Não mais motores”.

Não Por acaso o nome do personagem de Lavant é OSCAR.


Com uma narrativa densa e repleta de reviravoltas e pontos de viradas quase episódicos, o filme traz referencias cinematográficas em cada detalhe. Seja nos personagens vividos por Oscar, seja pelas sequências que trazem clara alusão a filmes clássicos do cinema. Vemos desde Pietá (na cena com Eva Mendes e Denis Lavant nu e excitado) ate mesmo Casablanca (na cena com Kylie Minogue).

A fotografia soberba em alguns pontos nos conduz aos primórdios cinematográficos, onde a tecnologia virtual não fazia parte da arte. Tons nada saturados e uma filmagem quase que completamente limpa, para em seguida sutilmente surgir carregada, escura e texturizada.

Há nudez, há simulação de sexo virtual e bizarro, há referencias ate mesmo ao teatro, e as artes circenses, no ato de interpretar e se mover tão caricatural de Lavant, e mesmo na maneira com que ele se caracteriza e se desdobra em incontáveis personas peculiares.

Mas independente do roteiro bem decupado e do enredo por vezes confuso, o grande trunfo do filme esta no trabalho de maquiagem e na atuação de Lavant. Nome recorrente a qualquer menção ao filme. O trabalho vocal, corporal e de expressão facial do ator é deslumbrante. Ele consegue imprimir clareza – única talvez durante toda a experiência que a película nos brinda- nos mais improváveis personagens numa naturalidade e facilidade extrema. Consegue emocionar e chocar na mesma medida.

Ao fim. Holy Motors nos contempla de maneira cruel com todos os clichês possíveis propositais e uma critica absurda não só ao cinema, mas ao ser humano no geral. Tudo sem cair na falha ambiciosa de soar intelectual demais ou forçado demais. Tudo é cru, direto, sujo.

Que vai alem da película e transforma essa experiencia numa visão do ser humano e da sociedade a cada dia mais robotizada raro de se ver atualmente de uma maneira eficaz - vista que Cosmópolis ( Cronemberg 2012) por exemplo tentou e não conseguiu plenamente-. Não sagazmente ao final vemos um Homem, retornando ao lar, para sua família de macacos afetuosos. Nosso primitivo exalando mais humanidade, do que a evolução tem permitido e demonstrado. Maquinas que tal qual desde a época do "Exterminador do Futuro" predizem conseguirem ser mais humanos que gente de carne, osso e coração. Ou mesmo ainda remontando as tragedias gregas, as atuações dos 'bizarros' entre suas mascaras sociais exalando papeis cotidianos em cada persona de Oscar.

Buñel e Lynch com certeza devem estar ainda pulando numa perna só e brindando de pé a essa obra.
Não é fácil, não é compreensível. Mas é instigante, densa e interessante. Uma obra obrigatória para a atualidade.

E como o próprio filme diz:  “a beleza esta nos olhos de quem vê”.

E assim o filme se coloca a mercê de ser mais um elemento de seu próprio feito ou se mostrar um messias diante de sua própria categoria.

Faça suas próprias interpretações. Porque muito mais do que tentar entender, Holy Motors existe para buscar compreensão pessoal em cada um que o assiste. Mil interpretações e sentidos para cada mil pessoas a vê-lo. Assim como o cinema.

E no final, é de Carax o ultimo quadro no projetor. 

CORTA!

Trailer:



FICHA TÉCNICA

Diretor: Leos Carax
Elenco: Denis Lavant, Edith Scob, Eva Mendes, Kylie Minogue, Elise Lhomeau, Jeanne Disson, Michel Piccoli, Leos Carax, Nastya Golubeva Carax, Reda Oumouzoune, Zlata,
Produção: Martine Marignax, Albert Prévost, Maurice Tinchant
Roteiro: Leos Carax
Fotografia: Yves Cape, Caroline Champetier
Duração: 115 min.
Ano: 2012
País: França, Alemanha
Gênero: Drama
Classificação: 14 anos











1 comentários:

Adorei a critica. Agora comecei a entender realmente o filme. Parabéns!

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