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sábado, 30 de março de 2013

Crítica: Toast



Baseado na biografia do chef Nigel Slater, Toast é situada na década de 1960, e acompanha a vida de um rapaz que, ao perder a mãe, enfrenta dificuldades de se relacionar com o pai e a madrasta, buscando na culinária uma forma de se expressar e superar as dificuldades.

Com uma direção despojada, Toast surge como um delicioso conto audiovisual repleto de sabor agridoce que destoa da regra de que filme bom é filme - somente- impecavelmente bem estruturado.

Com inicio logo no final da década de 50, o filme nos situa na vida da família Slater. O Jovem Nigel (Oscar Kennedy), sua mãe Sra. Slater (Vitoria Hamilton) e seu pai o Sr. Slater (Ken Stott)Nigel vive uma vida enlatada, tal quais os alimentos enlatados que sua mãe compra com afinco e prepara para a família. Sem nenhum dote culinário, a Sra. Slater vê nas comidas industrializadas, uma segurança extrema de bem estar de sua família. Extremamente protetora e zelosa, ela mantém uma relação de devoção ao filho, que contudo não partilha da mesma segurança de mundo da mãe. Nigel  sonha em conhecer um mundo mais amplo. Nem que esse mundo signifique apenas conseguir comer uma refeição que não seja artificial.
Sua relação com seu pai é extremamente fria. Nigel tenta a todo custo se aproximar de seu pai, que, contudo é distante e irritável consigo. Quando a Sra. Slater adoece, Nigel se vê desamparado entre o medo de perder a mãe e o medo de se ver só, sem afeto com o pai.
Após a morte da Sra. Slater, o Sr. Slater conhece a extravagante Sra. Potter (Helena Bonham Carter) que traz para Nigel e para sua vida um ode de contradições. Se por um lado o embate de ambos é imediato pela atenção e afeto do pai, o surgimento dela lhe traz justamente o mundo de possibilidades reais que sempre almejou. O mundo da culinária. Uma vez que a Sra. Potter é uma eximia cozinheira.

Deste ponto em diante o filme cria todo um ar fantasioso, de conto contemporâneo (apesar de se situar em décadas passadas) que vai traçando um mundo de descobertas, cheiros, cores e gostos para o protagonista.
 
O roteiro é inteligente ao colocar em simbolismos de cores, objetos e atos, cada característica daquela família, em especial entre pai e filho. A barreira que existe entre Nigel e seu pai é o alicerce da trama, mascarada pelo gosto a gastronomia. Sua descoberta sexual é outro ponto correto aqui. De bom gosto ao explorar de maneira peculiar uma característica desde a infância, sem ser destaque em nenhum momento. Ocorrendo de forma natural e ate mesmo lírica.

Com ares de filme francês, o filme vem carregado de métrica visual e de concepção de cenas. A fotografia carregada de detalhes, saturadas nas cores principalmente verde, e vermelha e esporadicamente amarela, traz curiosos focos delimitados que fazem alusão direta aos sentimentos de Nigel, como o papel de parede repleto de figuras delicadas, as flores sempre presentes nas roupas de sua mãe, os alimentos nos vestidos sempre justos da Sra. Potter.

Figurinos bem desenhados e pensados compõe todo o núcleo.
Entre os embates diretos, ora com olhares e indiretas, entre a Sra. Potter e Nigel, a trama flerta distantemente com o “Fabuloso Destino de Amelie Poulain” ao conseguir nos prender ali, naquele mundo entre a realidade e a fantasia de contos de literatura, sem parecer um filme profundo. O espectador sabe que não esta vendo uma grande produção ou obra prima, mas também não consegue vê-lo como um exemplar de “sessão da tarde” apenas.

Com uma trilha deliciosamente nostálgica e setentista com canções de Dusty Springfield, a película ainda nos brinda com atuações gostosas de apreciar com destaque a sempre fantástica Helena Bonham Carter, que consegue segurar bem a dualidade sempre enigmática e imprecisa de sua personagem. Pois apesar da Sra. Potter assumir o papel de antagonista para Nigel, ela em nenhum momento pode ser classificada como vilã. Alias seu personagem assume tal importância na vida de Nigel, que em uma palavra ao final do filme, ele expressa essa dualidade estranha que parece haver continuamente entre os dois. E dos jovens Oscar Kennedy – que interpreta Nigel durante a infância; e o interessante Freddie Highmore – que interpreta Nigel já adolescência- , que assume como sempre e com competência a mescla de inocência e amadurecimento em suas expressões.

Com um aspecto que versa entre o infantil e o sexual, o filme talvez peque apenas em escolher não se tornar uma obra nunca. Sempre que o filme parece caminhar para passagens inspiradoras, ele trava, desliza na simplicidade de querer ser apenas correto e não ir além, para permanecer sendo apenas um conto. E é justamente aí, que ele nos conquista.

Leve superficialmente, mas pesado e reflexivo ao expor personagens complexos quando analisado mais a fundo, Toast assim como a gênesis que o permeia é uma deliciosa experiência, rápida, que diverte, arranca sorrisos e emoção e nos deixa com uma vontade incontrolável de experimentar uma fatia de merengue de limão.

Um filme agridoce e que por isso, definitivamente não é apenas mais um “mais do mesmo” enlatado por ai. Recomendo.

Trailer:



Ficha Técnica:

Diretor: S.J. Clarkson
Elenco: Helena Bonham Carter, Freddie Highmore, Ken Stott, Frasier Huckle
Trilha Sonora: Ruth Barrett
Roteiro: Lee Hall, Nigel Slater
Duração: 96 min
Pais de origem: Reino Unido
Ano de lançamento: 2010
Gênero: Comédia/Drama