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terça-feira, 12 de julho de 2016

Critica: COHERENCE



Com um orçamento de pouco mais de 50 mil dólares, e filmado em apenas 9 dias, esse longa tem sido conhecido desde sua estreia tímida em 2013 como um dos melhores thrillers sci-fi dos últimos 10 anos (outros se arriscam a dizer, que seja talvez desse novo seculo). O bem da verdade, é que ''Coherence'' é um deleite visual - por percebermos como que uma ideia suplanta a falta de orçamento -, de roteiro - onde o argumento vale por qualquer outra super produção hollywoodyana -, e que instiga justamente pela habilidade do diretor em criar uma tensão verossímil, mesmo diante da inverossimilhança possível - ou não - diante dos menos criveis as teorias quânticas, cientificas e etc etc.

A sinopse é simples: 8 amigos decidem se encontrar para uma reunião/jantar de confraternização para relembrar os velhos tempos. Durante o jantar, há um cometa chamado Miller que esta passando pela orbita da Terra. Entre as conversas os amigos relembram as noticias - a maioria infundada - de que pessoas acreditam que esse cometa e outros alteram certas coisas no planeta, como celulares que param de funcionar ou pessoas que alteram seu comportamento. 
Eis que ocorre um apagão em toda a vizinhança, e ao olharem pela janela para saber o que ocorreu, os amigos notam que ha apenas uma unica casa, a dois quarteirões de lá com luz. Apenas essa casa num amontoado de escuridão. Dois deles resolvem sair para pedir para usar o telefone dos moradores dessa residencia (pois um deles precisa falar urgentemente com o irmão). Ao voltarem, coisas estranhas começam a surgir.

Ele mescla dois conceitos básicos da ciência: A teoria do Multiverso e a teoria do Gato de Schrödinger, uma das mais famosas teorias acerca da incoerência e decoerência quântica.

O Multiverso versa sobre a teoria das cordas, estudos sobre a enigmática matéria escura e os resultados obtidos sobre a expansão crescente e sem retorno do nosso universo parecem exigir uma resposta que rompe com um paradigma fundamental - o universo é infinito e nele tudo está contido. A teoria do multiverso traz o sentido no nome: existiriam infindáveis universos numa espécie de queijo de energia quântica, onde bolhas se formam e somem sem parar. O nosso universo seria um deles. Resumindo: É a teoria de que existem milhares de universos. (o filme inclusive brinca com essa parte quando em certo momento um dos diálogos cita um pedaço de queijo e ketamina como aperitivo antes do jantar rsrs).

Já a base mais evidente do argumento do filme esta na teoria do Gato de Schrödinger ( Schrödinger foi um físico austríaco ganhador do Prêmio Nobel de Física e tido como um dos cientistas mais celebres do seculo XX), que consiste numa experiencia onde se coloca um gato imaginário dentro de uma caixa com um pote de veneno e fecha-o la dentro. A caixa onde seria feita a hipotética experiência de Schrödinger contém um recipiente com material radioativo e um contador Geiger, aparelho detector de radiação. Se esse material soltar partículas radioativas, o contador percebe sua presença e aciona um martelo, que, por sua vez, quebra um frasco de veneno. De acordo com as leis da física quântica, a radioatividade pode se manifestar em forma de particulas ou ondas - e uma partícula pode estar em dois lugares ao mesmo tempo. As ondas representam as probabilidades de ocorrência dessa dupla realidade, quando, na mesma fração de segundo, o frasco de veneno quebra e não quebra. Assim, teríamos duas possibilidades possíveis: 


a) O gato aparece vivo, porque, nessa versão da realidade, nada foi detectado pelo contador Geiger, e portanto ele não quebrou o frasco de veneno que mataria o gato.


b) O gato surge morto, pois nessa outra versão do mesmo instante de tempo o contador Geiger detectou uma partícula e acionou o martelo. O veneno do frasco partido matou o animal.


Seguindo o raciocínio de Schrödinger, as duas realidades aconteceriam simultaneamente e o gato estaria vivo e morto ao mesmo tempo até que a caixa fosse aberta. A presença de um observador acabaria com dualidade e ele só poderia ver ou um gato vivo ou um gato morto.
Simplificando, a teoria cujo o filme implica, é aquela famosa ideia de que existem vários universos e realidades coexistentes ao mesmo tempo/espaço e que nossas escolhas constantes alteram cada linha de realidade.
Dirigido por James Ward Byrkit (sua estreia na direção. Ele foi co-roteirista da animação ''Rango"), o filme brilha justamente por trazer esses conceitos de forma orgânica ao unir a ciência teórica, numa especie de experimento 'possível' através da desculpa de gancho de roteiro do cometa (que seria aqui a força inexplicável capaz de interferir nessas leis quânticas e físicas), mas usando isso para debater e refletir sobre as relações humanas e existenciais. Não importa muito a certo momento do filme como pode ser possível X ou Y situações, por que o que importa de fato são os pensamentos e atitudes daqueles 8 amigos diante daquelas milhares de possibilidades e situações apresentadas.
Todos os amigos ali, se reúnem depois de vários anos, cada um tendo uma escolha na vida que os levaram a vários caminhos diferentes. nem todos surgem satisfeitos com suas escolhas - como todos nós diariamente -. Quando esse lapso ocorre ali, cada ação altera uma realidade daquela dinâmica em diferentes espaços e tempos, mas altera também a dinâmica deles, com eles mesmos. Em certo momento uma das personagens diz que aquela experiencia poderia ser aquilo que todos nós humanos sempre no intimo queremos ao longo da vida: poder encontrar-se consigo mesmo em diferentes realidades de escolhas que não fez. Como eu estaria hoje se eu tivesse pegado o ônibus detrás e não aquele que veio antes? Como eu estaria se eu preferisse vir a pé ou de taxi? Como seria minha vida hoje se eu tivesse escolhido aquele outro curso, aquela outra roupa, ou simplesmente, acordado cinco minutos mais cedo? Ocorreria algo na minha vida, no meu caminho ate aqui diferente por causa dessa minima escolha que fiz? E se cada uma dessas possibilidades, desses 'eus' pudessem se encontrar num mesmo lugar e tempo e se confrontarem? Eu descobriria quem eu realmente sou em toda a vasta complexidade de facetas que somos?

Em vários momentos o filme me passou o clima da lendária serie Twilight Zone, de meados dos anos 50/60. Uma mescla de terror e suspense, com aplicações filosóficas, de desfecho surpreendente e instigante.

Apesar de parecer muito complexo, a dinâmica em si é simples, apos acompanhar o filme. basta prestar atenção nos detalhes que ele fornece - cada frase é essencial para o entendimento, por mais que na hora pareçam jogadas a esmo. Não são.

Eu pessoalmente só me enrolei de fato - e certeza que essa foi a intenção do diretor - com os 3 minutos finais do filme. Onde o conceito básico do experimento se choca com uma 'incoerência' do próprio sentido cientifico dele. Mas, que abraço outros conceitos possíveis, e por isso são teorias.

Contando ainda com uma trilha sonora pontual e certeira em cumprir o papel de ir preparando o clima para as ações - o que faz com que o filme as vezes tenha ares de Terror ou Suspense; uma ótima surpresa ainda é a fotografia que ainda que não tenha nada de muito rebuscada, possui uma logica narrativa eficiente, ainda mais quando se percebe os artifícios usados para burlar o baixo orçamento - como a utilização de velas, e luz ambiente. A câmera na mão aqui também é funcional e não apenas um recurso de linguagem. Parte pela produção modesta e parte para passar a sensação de proximidade com os espectador.

Um filme gigante como o tema que aborda, uma surpresa grata de estreia de um diretor que pretendo acompanhar e principalmente um alivio diante de tanta produção bilionária rasa por ai, que prova que uma ideia inteligente vale mais do que qualquer super câmera ou grande elenco famoso.

Recomendável (mas pode causar enxaquecas)





Trailer:





Ficha Técnica:

Direção: James Ward Byrkit
Roteiro: James Ward Byrkit, Alex Manugian (co-roteirista)
Elenco: Emily Baldoni, Maury Sterling, Nicholas Brendon, Elizabeth Gracen, Alex Manugian, Lauren Maher, Hugo Armstrong, Lorene Scafaria
Trilha Sonora: Kristin Øhrn Dyrud
Fotografía: Nic Sadler, Arlene Muller
Duração: 89 min.
País: EUA
Ano: 2013

Prêmios: Festival de Sitges como Melhor Roteiro (2013) e Gotham como Melhor Novo Diretor (2014)








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