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sábado, 6 de outubro de 2012

Critica: Picnic at Hanging Rock




Austrália. 1900.
Alunas do Internato Feminino são levadas para um Picnic no dia de São Valentin – conhecido aqui no Brasil como dia dos namorados -. O lugar escolhido é a Montanha de origem vulcânica, chamada Hanging Rock. Um lugar paradisíaco.
Mas ao final do dia, todas as garotas retornam ao internado em ligeiro choque: 3 delas e uma professora desapareceram misteriosamente.

Picnic at Hanging Rock (Picnic na Montanha Misteriosa,titulo  em português), um filme de 1975, do grande diretor Peter Weir que já nos brindou com obras como “Sociedade dos Poetas Mortos”, “Show de Truman” e “Mestre dos Mares”, conta uma história de aflição, psicodelia, quase surrealista, com toques de mistério e verdadeiro terror e fascínio.

Baseado no livro de mesmo nome da escritora Joan Lindsay, em 1967; o filme traça um panorama de angustia e ao mesmo tempo de fascínio. 
Weir consegue criar um universo repleto de lirismo, com belas paisagens, mulheres belíssimas, de ares inocentes, mas que no segundo seguinte nos puxa para um verdadeiro ode de terror, medo, angustia e expectativa.

Desde o inicio somos impelidos a conhecer o mundo em que vivem as meninas do internado. Belas, jovens e educadas, todas tem em comum a rigidez pela qual são conduzidas através de sua diretora. Uma mulher rude que administra o internado a rédias curtas.

Mas é Sara visivelmente a garota mais solitária e desfavorecida ali, que literalmente sofre nas mãos da diretora. Sara é uma garota tímida, que não aceita de bom grado todas as imposições que lhe são propostas, e que nutre um amor incondicional por Miranda - a garota mais querida de todo o internado-; que se torna sua única amiga e confidente. Que é constantemente comparada a um lindo Anjo de mistério e beleza.

Todas as garotas tem permissão de ir ao Picnic, com exceção de Sara. Que por algum motivo entende que jamais vera Miranda novamente.
Miranda é uma das garotas que desaparece.
A dualidade imposta pelo enredo é muito peculiar. Tudo, cada cena, cada fala, cada plano, cada personagem esconde uma intenção ou desejo aquém das aparências. A própria amizade de Sara e Miranda é constantemente tratada como se Sara estivesse apaixonada por Miranda.
Miranda exibe continuamente trejeitos e um sorriso que parecem esconder algo atrás da serenidade.  Ela de fato, meio que profetiza seu destino.

A sexualidade no filme é latente também, mas tratada sem uma cena se quer que elucide isso. Não há nudez, não atos sexuais, não há um único beijo. Tudo fica imposto pela subjetividade do contexto. É genial.
A imagem da Montanha adquire aos olhos do espectador uma presença orgânica, mesmo que pelas vias de fato ela seja inofensiva.

Contudo o que predomina aqui e interessa não é a investigação, o desaparecimento das garotas. O que importa em Picnic são as ações de quem permanece. A jornada. E isso se deve a construção narrativa do roteiro. Uma atmosfera que beira a loucura e a esquizofrenia psicótica. Não há a preocupação por explicações. Só a demonstração dos fatos ocorridos.

Contando com uma fotografia exemplar e instigante que, em tons pasteis - a paleta de cores é viva, quase que completamente puxada para o azul, branco, verde e amarelo - com exceção do internato onde predominam as cores escuras e densas, com contrastes entre luz e sombra, para passar a ideia de repressão – faz tudo parece ter saído de um quadro de Botticelli ou de Monet, onde há bastante referencia ao renascimento e ao impressionismo e elementos de natureza morta também. Tudo é elucidativo ao extremo. Fotografia essa que é ponto chave ao lado da trilha sonora, para criar esse ambiente denso. Tudo enevoado e sombrio. Planos ora fechados e ora abertos, que prezam aos detalhes da direção de arte conturbada e carregada, com quadros e esculturas vitorianas mas com certo cunho macabro - cabeças de corvos, escadas de madeira maciça e escura, candelabros com formas estranhas-.

As imagens se contrapõem, em cenas que beiram a perfeição fílmica.
É o som da flauta que parece um grito de dor, são os cavalos que relincham enraivecidos, os cães que uivam de noite, os pássaros que fogem em debandada. Os relógios que param ao meio-dia; as formigas que devoram o bolo da merenda.

A trilha sonora é um achado a parte, com belas canções orquestradas, aonde vamos da delicadeza de acordes longos e melódicos, a sinfonias altíssimas, descompassadas e alarmistas. Repleta de canções tradicionais romenas, e órgãos.

Curiosamente Weir optou por uma técnica que só fez aumentar o tom alarmante e intenso do filme; desde o inicio surge um aviso na tela, de que as ações mostradas, são uma representação dos fatos verdadeiros ocorridos. Weir trata a historia como baseada em fatos reais.
Mas não é. Ou ao menos acredita-se que não seja. O Livro vem com a premissa de que os eventos ali narrados "podem terem sido baseados em fatos verdadeiros". Inclusive a imprensa e a maior parte do povo australiana ainda hoje acredita ter se tratado de eventos reais. Mas por conterem muitos elementos que sugerem uma presença de acontecimentos sobrenaturais, acreditasse que tanto o livro ao qual foi baseado e o filme se tratam de uma ficção. Mas isso não é dito no filme.

Originalmente, o Livro de Joan Lindsay, continha um distinto capitulo 18, onde ela explica os mistérios acerca dos desaparecimentos. Sua editora a época, convenceu-a a não publicar esse capitulo, o que foi uma decisão definitiva para o sucesso tremendo do livro. 
Weir optou por não incluir essa parte no filme também. Felizmente! 
A resolução não importa aqui, mas sim a jornada. Qualquer explicação estragaria a obra - mesmo que tal explicação seja extremamente surrealista em si-.

Ainda é curioso observar a maneira que tanto diretor quanto autora usam a natureza, a força e a influencia da feminilidade como forma de simbolismo, à influencia britânica na Austrália e ao contraponto da imposição do catolicismo à época. E principalmente as funções de tempo e espaço.
O tempo é algo gradual e disperso durante toda a obra. Seja pelos relógios sempre parados ou que surgem difusos, seja pela própria montagem do filme que confere uma velocidade descompassada a narrativa. As forças das arvores, a imponência dos ventos, as roupas intimas e o tecido das roupas das meninas, sempre brancos, ou muito claros. Os animais retratados de forma plena e natural. A montanha que parece crescer cada vez mais diante de nossos olhos e seu planalto que parece nunca ser abandonado pelo sol e o tempo aberto.

Picnic consegue ser um filme grandioso, onírico, fascinante e ao mesmo tempo aterrorizante. Cada espectador inevitavelmente forma suas próprias teorias acerca do que aconteceu com as garotas e sua professora. Eu formei a minha. Formem as suas.

Como diz um dos diálogos: “Aquilo que vemos e aquilo que parecemos não é mais do que um sonho dentro de outro sonho". E nisso Picnic at Hanging Rock é um prato cheio! 

Clássico obrigatório.





FICHA TÉCNICA

Diretor: Peter Weir
Elenco: Rachel Roberts, Dominic Guard, Helen Morse, Margaret Nelson, Jacki Weaver.
Duração: 110 min.
Ano: 1975
País: Austrália
Gênero: Drama
















2 comentários:

Crítica muita fraquinha: Peter Weir já realizou ótimos filmes mas não foi o caso deste.

Este comentário foi removido pelo autor.

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